O Senado vota nesta quarta-feira (19) um projeto de lei complementar (PLP) que reestabelece a possibilidade de execução de recursos, a partir de 2019, que ainda não foram pagos. A proposta, de autoria do líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), vai contra um veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao sancionar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) aprovada este ano e pressiona ainda mais o Orçamento de 2025.
A proposta é o item único da pauta desta quarta-feira e, segundo parlamentares que participaram de reunião de líderes, há um acordo para aprovação na matéria que terá como relator o líder do PL, Carlos Portinho (RJ). O projeto também acirra o impasse com o Supremo Tribunal Federal (STF) pois libera o pagamento de emendas parlamentares bloqueadas pela Corte.
O projeto de Randolfe prevê que os “restos a pagar” a partir de 2019 poderão ser executados até o fim de 2026, inclusive as rubricas que foram canceladas em 31 de dezembro de 2024.
“Os restos a pagar não processados, inscritos a partir de 2019, a que se referem o art. 172 da Lei nº 14.791, de 29 de dezembro de 2023, poderão ser liquidados até o final do exercício de 2026, inclusive os que tenham sido cancelados em 31 de dezembro de 2024”, informa o artigo único da proposta.
No parecer da LDO votado no final de 2024, de autoria do senador Confúcio Moura (MDB-RO), foi incluído um artigo prevendo que esses recursos só poderiam ser “bloqueados, não liquidados e cancelados depois de 31 de dezembro de 2025”.
“Os restos a pagar relativos a contratos, convênios, acordos ou ajustes de vigência plurianual, inscritos em 2019, 2020, 2021 e 2022, inclusive os enquadrados conforme o art. 1º do Decreto nº 10.579, de 18 de dezembro de 2020, somente poderão ter seus saldos, bloqueados ou não liquidados, cancelados depois de 31 de dezembro de 2025”.
O trecho, no entanto, foi vetado por Lula na sanção sob o argumento de que estaria violando os princípios constitucionais da LDO e que teria um impacto nas contas públicas.
“O dispositivo, ao tratar de regras perenes de restos a pagar, consagra normas que extrapolam um exercício financeiro e assim não guarda compatibilidade com a vigência da lei de diretrizes orçamentárias, o que violaria, portanto, o comando previsto no art. 165, § 2º, da Constituição. Ademais, a proposição contraria o interesse público, pois a criação de exceções à legislação referente a restos a pagar (Decreto nº 93.872, de 23 de dezembro de 1986) contribuiria para a elevação do estoque de restos a pagar e dificultaria assim a gestão financeira eficiente”, aponta a justificativa do veto.
O impacto fiscal da proposta causou surpresa em técnicos do Senado ouvidos pelo Valor justamente pelo projeto ser de autoria do líder do governo em um momento em que o Executivo enfrenta desafios para atingir a meta de déficit zero. Uma fonte, ouvida sob sigilo, explicou que os restos a pagar “ressuscitados” pelo projeto precisarão ser incorporados na Proposta de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2025, que ainda não foi aprovada e onde o governo precisa incluir novas despesas como o programa Pé de Meia e o Auxílio Gás.
O PLP também desafia a decisão do ministro do STF Flávio Dino de suspender o pagamento de emendas de relator (RP9) e de comissão (RP8), exigindo maior transparência nos repasses. A proposta engloba as duas modalidades que representam o antigo e o atual modelo do chamado orçamento secreto. Os recursos são discricionários, ou seja, não tem o pagamento obrigatório e dependem de negociação política com o governo para a liberação.
Ao todo, Dino suspendeu R$ 6,7 bilhões em emendas de comissão, sendo R$ 4,2 bilhões da Câmara e R$ 2,5 bilhões do Senado.
Relator da proposta de restos a pagar, Portinho diz que o bloqueio das emendas está “travando” os trabalhos no Congresso. Ele nega que os bloqueios do Judiciário sejam atingidos pelo projeto.
“Com relação a questão das emendas, ela trava o funcionamento do Congresso. A gente não pode avançar, o país não pode avançar, sem resolver essa questão das emendas que foi uma pedra que o Judiciário colocou”, disse.
Na terça-feira (18), o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), defensor e operador das emendas parlamentares, visitou o presidente do STF, Luís Roberto Barroso. Dino também participou do encontro e o impasse das emendas foi tema da conversa.
Fonte: Valor