A dualidade de ocupar espaços » STEAL THE LOOK

Eu sempre entendi a importância de pessoas como eu ocupar espaços, principalmente aqueles que sempre foram inacessíveis para a comunidade negra e ainda são um privilégio para poucos. Afinal, nós também merecemos ter acesso a coisas de qualidade e experiências consideradas luxuosas. 

No entanto, quando chegamos até esses espaços pode ser difícil, porque ainda somos minoria, o que torna essa vivência solitária e até dolorosa, mesmo quando se trata de algo bom e que sempre sonhamos. 

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Pessoa sentada à beira de uma piscina em um terraço elegante. Algumas pessoas relaxam nas espreguiçadeiras ao fundo. Ocupar espaços

Foto: Karen Merilyn (Reprodução/Instagram)

Sou alguém que nunca teve acesso a eventos luxuosos, viagens de avião ou experiências fora do comum, mas isso mudou quando entrei no STL e tive o privilégio de viajar o Brasil, ir para muitos eventos maravilhosos e estar em lugares que jamais pensei que estaria. 

Foram nessas ocasiões que, por exemplo, comi caviar pela primeira vez (um marco para todo pobre que cresceu ouvindo Zeca Pagodinho), fiz um cruzeiro (algo que nunca imaginei), entrei no Copacabana Palace e até fiz minha primeira viagem internacional. Realizei muitos sonhos através do meu trabalho e sou muito grata a isso. 

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Pessoa em um vestido branco, em um evento ao ar livre decorado com flores e luzes, segura microfone. Ocupar espaços ao seu redor.

Foto: Karen Merilyn (Reprodução/Instagram)

Porém, apesar de ser incrível ter acesso a esses espaços, muitas vezes o sentimento é que eu não mereço estar ali, porque aquilo não foi feito para mim ou para pessoas como eu. No meio de algumas das melhores experiências da minha vida, eu me vi triste e ansiosa, porque a sensação de solidão que pairava me impedia de curtir aquele momento em sua totalidade.

A situação de olhar em volta e ver que a maioria das pessoas negras do ambiente estão em cargos de serviço, enquanto eu sou uma das poucas (se não a única) como convidada é um dos motivos desse desconforto. 

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Pessoa sorrindo em um deck de navio, vestindo roupa colorida e sandálias rosa, com oceano e ilhas ao fundo. Ocupar espaços

Foto: Karen Merilyn (Reprodução/Instagram)

Além disso, tem o fato de que apesar de estar nesses lugares, vivendo experiências incríveis e comendo “do bom e do melhor”, sou uma mulher que mora na periferia de uma cidade do interior. Ainda não posso oferecer essas coisas à minha família, por exemplo, ou vivê-las sem estar trabalhando — e isso me faz sentir na pele a diferença de vivências entre as classes sociais. 

Nesses momentos, só me vem à cabeça um trecho de “Hoje Cedo”, do Emicida, em que ele diz que está “vendo os boy beber dois mês de salário da minha irmã”. Só quem tem esse tipo de experiência, em que está vendo muitas pessoas consumindo coisas que custam mais que o salário mínimo, entende a sensação de impotência frente à desigualdade social. 

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Pessoa com boina azul e casaco vinho em frente a uma catedral gótica na luz do dia. Ocupar espaços

Foto: Karen Merilyn (Reprodução/Instagram)

Por isso, eu nunca consigo ficar à vontade em aeroportos, em ambientes privilegiados e em espaços que classes mais altas sempre tiveram acesso e que para eles são comuns, mas para mim são surreais. 

Eu entendo que justamente por isso é importante que eu esteja ali, subvertendo o senso comum e mostrando que sim, nós também podemos e merecemos desfrutar de luxo, de boas comidas, de experiências premium, mas também é muito claro para mim que isso não é o suficiente. Ocupar espaços significa levar os nossos com a gente sempre que possível, até que todos nós possamos mostrar que somos merecedores e também podemos pertencer a lugares historicamente excludentes. 

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Fonte: Steal the Look

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