Com dinheiro na mão, setor de saneamento se prepara para expansão dos serviços | Saneamento

A Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon Sindcon) estima em 26 os ativos de saneamento com potencial de ir a leilão em 2025. Isso proporcionará investimentos de R$ 70 bilhões no setor. A maioria dos projetos é de pequeno e médio portes. Entre os ativos de grande porte está a concessão de água e esgoto do Pará. Apenas esse certame, agendado para 11 de abril, deve impulsionar aportes de R$ 18,5 bilhões.

Outros grandes leilões previstos para 2025 são as concessões de Pernambuco e Rondônia, com investimentos estimados em R$ 18,2 bilhões e R$ 5,8 bilhões, respectivamente. Tem também a Parceria Público-Privada (PPP) do serviço de esgoto da Paraíba, que prevê aportes de R$ 5,7 bilhões. Os valores de referência são do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que realiza a estruturação dos projetos. Na estimativa da Abcon também está listada a PPP de serviço de esgoto de Goiás, com investimento de R$ 6,6 bilhões. O BNDES prevê o leilão apenas em 2026.

Para o próximo ano, a instituição projeta ainda a concessão do saneamento do Maranhão, a PPP de esgoto do Rio Grande do Norte, e a PPP de água e esgoto da Copanor, que atende o norte e nordeste de Minas Gerais. Juntos, os três contratos têm potencial de alavancar R$ 25,4 bilhões em investimentos. Ao todo, os novos recursos mobilizados a partir de leilões de serviços de água e esgoto previstos para 2025 e 2026 podem superar R$ 95 bilhões.

Agentes financeiros e especialistas no setor avaliam que há disponibilidade de capital e interesse no mercado para absorver o grande volume de empreendimentos programados no biênio. “O mercado abraçou o setor de saneamento básico e não faltará suporte financeiro para os projetos”, diz Rogério Yamashita, responsável pela área de infraestrutura em project finance no Itaú BBA. Como consultora financeira, nos últimos três anos, a instituição contratou R$ 45 bilhões para seus clientes na área de saneamento junto a bancos de fomento nacionais e multilaterais, no mercado financeiro privado e no mercado de capitais.

Segundo Yamashita, o setor apresenta características que agradam ao investidor. O concessionário assume um ativo que já possui receita conhecida, perene e estável. “Ninguém deixa de consumir água”. Além disso, a base de clientes é pulverizada, o que reduz riscos. Outro atrativo é a possibilidade de o operador de serviços aumentar rapidamente as receitas ampliando a base de clientes, ao estender os serviços em áreas não atendidas, e ao realizar um trabalho de redução da inadimplência, que apresenta uma média de 25% no Brasil.

Ao mesmo tempo, o operador pode reduzir custos, combatendo perdas de água. O Instituto Trata Brasil calcula que 38% da água tratada no Brasil é perdida na distribuição. “Em geral, os operadores de saneamento assumem as concessões já com um bom diagnóstico das ações que devem realizar para maximizar o retorno do investimento”, diz Yamashita.

De acordo com a Abcon, já foram realizados no Brasil 57 leilões de água e esgoto, impulsionando investimentos de R$ 161 bilhões. O grande impulso veio com o Marco Legal do Saneamento, Lei nº 14.026, de 2020, que determinou o atendimento de 99% da população com abastecimento de água tratada e 90% com esgotamento sanitário até 2033 e estabeleceu a responsabilização dos agentes públicos, caso as metas não sejam atingidas. “Foi uma mudança de paradigma. O gestor público viu que não teria dinheiro para realizar os investimentos e foi buscar apoio privado”, diz Christianne Dias, diretora-executiva da Abcon Sindcon. “Por outro lado, o marco legal gerou segurança jurídica ao setor privado, que se interessou pelas oportunidades do setor”, afirma.

A expectativa no mercado é que nem mesmo a alta taxa de juros cobrados pelos empréstimos no Brasil – com a taxa de referência, a Selic, em 14,25% ao ano – deve inibir o interesse nos ativos de saneamento. “São investimentos de longo prazo, com 30 anos de concessão. Se o projeto é bem elaborado, com retorno consistente, como tem prevalecido no setor, o investidor não desiste por conta de adversidades momentâneas”, ressalta Yamashita.

Mercado abraçou o setor e não faltará suporte para os projetos”

— Rogério Yamashita

O BNDES tem forte presença no setor. A instituição atua na estruturação de projetos que vão a leilão, tendo estruturado oito projetos já leiloados. Soma ainda nove no pipeline atual. O banco atua também como agente financeiro. Desde 2018, já aprovou R$ 36,7 bilhões em financiamentos para o setor, somando desembolsos de R$ 17 bilhões. “Temos disponibilidade de financiar até 80% de um projeto, com recursos a taxas de mercado”, diz o diretor de planejamento da instituição, Nelson Barbosa.

O banco opera ainda como coordenador de oferta pública de debêntures, tendo realizado nove operações no setor, que somam R$ 13,2 bilhões. Segundo Barbosa, além dos ativos de água e esgoto, o BNDES planeja ampliar sua atuação na área de saneamento com projetos de resíduos sólidos. Por isso já deu início a estruturação de dois projetos na área, um para o Amapá e outro para Goiás. A expectativa é que avancem para leilão em 2026. “Os leilões de resíduos sólidos terão um forte crescimento nos próximos anos”, projeta Barbosa.

As debêntures incentivadas, títulos de dívida empresarial isentos de Imposto de Renda para o investidor pessoa física, se tornaram um importante mecanismo de financiamento para o setor de infraestrutura. Em 2024, as emissões de debêntures incentivadas na área de saneamento somaram R$ 12,1 bilhões e apenas no primeiro bimestre de 2025 totalizaram R$ 4,94 bilhões. Desde 2019, superam R$ 43 bilhões.

“Há um grande apetite do investidor por debêntures de empresas de infraestrutura que atuam em áreas com boa regulação, como são os casos dos setores de energia, transportes e saneamento”, diz Cristiano Cury, coordenador da Comissão de Renda Fixa da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). “A perspectiva é muito boa para as novas emissões vindas das empresas que conquistem ativos nos próximos leilões de saneamento”, diz o executivo.

Outra possibilidade de financiamento são os bancos multilaterais. Em novembro de 2024, a International Finance Corporation (IFC), braço de investimentos do Banco Mundial no setor privado, concedeu um empréstimo de R$ 1 bilhão para a Sabesp para a melhoria de infraestrutura de água e saneamento ao longo do rio Tietê, com impacto previsto na vida de 360 mil paulistas.

Desde o marco legal, a IFC também concedeu empréstimos para a Corsan, do Rio Grande do Sul, e para a Sanasa, empresa de economia mista que atende Campinas (SP). “Nenhuma outra atividade tem mais impacto positivo para a sociedade do que o saneamento”, diz João Carneiro, responsável pela área de investimentos em infraestrutura da IFC.

Fonte: Valor

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