Ex-ministro de Dilma defende no STF acusada de participar de tentativa de golpe contra Lula | Política

Ex-ministro do governo Dilma Rousseff e historicamente ligado ao PT, o advogado Eugênio Aragão subirá à tribuna da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira (22) para defender uma das acusadas de participar da trama golpista para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no poder. Eugênio assumiu em fevereiro a defesa da delegada da Polícia Federal (PF) Marília Ferreira de Alencar, denunciada por omissão no 8 de janeiro e de atuar para atrapalhar o deslocamento de eleitores de Lula no segundo turno das eleições de 2022.

Além de ministro da Justiça de Dilma, Aragão defendeu Lula nas campanhas de 2018 e 2022 e foi responsável, junto com o hoje ministro Cristiano Zanin, por uma das ações que levaram à inelegibilidade de Bolsonaro. Questionado sobre o motivo de ter topado defender Marília, disse ao Valor que a resposta é complexa, mas definitivamente não envolve dinheiro ou qualquer afinidade política com a delegada, que ele considera como de “direita”.

Aragão e Marília atuaram na Procuradoria-Geral da República (PGR) e se conhecem há mais de 30 anos. Ele diz que assumiu o caso de graça a pedido da própria delegada. Pesou na decisão, conta, o fato de Marília ter sido assessora e “pessoa de confiança” de seu amigo Carlos Eduardo Vasconcelos, subprocurador-geral da República falecido em 2020.

“Conheço a Marília há mais de 30 anos. Ela trabalhou na PGR por 20 anos. É uma pessoa que conheço há muito tempo e sei que é correta. A discussão supera qualquer diferença político-ideológica. Devo isso ao Carlos Eduardo Vasconcelos. Ela foi assessora dele durante 8 anos. Pessoa de absoluta confiança dele. E estou fazendo isso pro bono [sem remuneração]”, conta.

Em 2022, Aragão criticou Marília nominalmente em uma live. Na ocasião, disse que a delegada é “bolsonarista de carteirinha” e participou das manifestações “pelo golpe contra Dilma”. Agora, afirma que isso pesa menos diante do “drama humano de uma pessoa” que conhece.

“Minhas convicções são de esquerda. Sempre foram. Mas uma coisa é o que você acredita e outra é o drama humano de uma pessoa que conheço. Ela também metia o pau em mim. Dizia por aí que eu era petista. A convicção dela é de direita. Mas e daí? Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa”, contou ao Valor.

Marília integra o núcleo dois de acusados de golpe. A análise da denúncia contra o grupo será feita pela Primeira Turma do STF entre esta terça-feira (22) e quarta-feira (23). O núcleo, segundo a PGR, seria o responsável por sustentar a permanência de Bolsonaro no poder, a despeito da derrota para Lula nas eleições de 2022.

Além de Marília, integram o grupo Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF); Fernando de Sousa Oliveira, delegado da Polícia Federal (PF) e ex-secretário executivo da Secretaria de Segurança Pública do DF; Mário Fernandes ex-número dois da Secretaria-Geral da Presidência e general da reserva; Marcelo Costa Câmara, coronel da reserva e ex-assessor de Bolsonaro; e Filipe Martins, ex-assessor especial de Assuntos Internacionais da Presidência.

Quando estava no Ministério da Justiça, a delegada teria municiado a PRF com informações sobre os municípios com mais eleitores de Lula. Os policiais, sob o comando de Silvinei Vasques, teriam se valido desses dados para fazer diversas blitze em estradas e atrapalhar que os eleitores chegassem aos locais de votação.

“Belford Roxo [no Rio de Janeiro] o prefeito é vermelho. Precisa reforçar a PF […] Menos 25.000 votos no 9”, disse em referência a Lula, segundo as investigações. A conversa teria ocorrido depois do primeiro turno das eleições de 2022 em um grupo com outras pessoas do Ministério da Justiça de Bolsonaro.

Após a troca de governos, ela foi para a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal. Para a PGR, a atuação de Marília na secretaria foi omissa. O órgão não teria, por exemplo, alertado adequadamente outras autoridades sobre o planejamento dos atos de 8 de janeiro.

Segundo Aragão, não houve atuação em conjunto com a PRF para barrar o deslocamento de eleitores de Lula. Quanto ao 8 de janeiro, afirmou, Marília fez relatórios de inteligência e repassou a seus chefes.

“Ela e o Silvinei [ex-chefe da PRF] nem se conhecem. Quem já foi ministro da Justiça sabe da rivalidade, quase inimizade, entre PF e PRF. E quando ela esteve no 8 de janeiro na secretaria, ela fez o que deveria fazer. Elaborou um relatório e levou ao seu chefe. Falou dos acampamentos [em frente a quartéis do Exército] e tudo. O caso dela é diferente dos outros. Ela respondeu por um Processo Administrativo Disciplinar, que foi arquivado, e a um inquérito civil movido pelo Ministério Público Federal, que também foi arquivado. Os dois sobre o 8 de janeiro”, disse.

Atos golpistas do 8 de janeiro de 2023 — Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Atos golpistas do 8 de janeiro de 2023 — Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Fonte: Valor

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