Indústria de máquinas e equipamentos agrícolas ensaia retomada | Agronegócio

A indústria de máquinas agrícolas espera neste ano deixar para trás uma fase muito negativa em sua trajetória recente, depois de acumular retrocesso de praticamente 37% entre 2022 e 2024. A receita líquida total do setor cresceu 17% no primeiro bimestre, atingindo quase R$ 9,420 bilhões, com elevação de 15,1% quando consideradas apenas as vendas para o mercado doméstico.

Na prática, os negócios pararam de cair em novembro de 2024 e, desde lá até fevereiro deste ano, observa Pedro Estevão Bastos, presidente da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas (CSMIA) da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), acumularam alta de 12% em relação aos números registrados entre novembro de 2023 e fevereiro do ano seguinte.

O avanço no primeiro bimestre deste ano, prossegue Bastos, foi favorecido também pela base de comparação muita achatada em 2024. A colheita de uma safra recorde para a soja e a recuperação da produção de milho, refletindo certa normalização para o clima, chegou a estimular a Abimaq a antecipar uma previsão de crescimento de 8,2% para a receita líquida do setor neste ano, “antes do trarifaço promovido pelos Estados Unidos”, pondera Bastos. Depois disso, o cenário tornou-se mais nebuloso, com maiores incertezas em relação ao comportamento das taxas de juros e ao câmbio, em função das medidas adotadas pelo governo de Donald Trump.

“De toda forma, da porteira para dentro a indústria antecipa um ano normal nos setores de soja, milho, algodão, café, cana, citros e na pecuária”, comenta Bastos. A seu ver, a demanda tende a ser reforçada pela perspectiva de alta real de 11% no valor bruto da produção agropecuária, que para este ano é estimado em R$ 1,431 trilhão pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). “São quase R$ 142 bilhões a mais do que em 2024”, reforça o executivo da Abimaq.

A AGCO, dona das marcas Fendt, Massey Ferguson, PTx e Valtra, e a John Deere, fabricante de tratores, colheitadeiras, colhedoras de cana e pulverizadores, igualmente apostam na recuperação em 2025. Os produtores têm demonstrado maior intenção de compra nas feiras agropecuárias já realizadas até o momento, registra Rodrigo Junqueira, diretor geral da AGCO e vice-presidente da Massey Ferguson para a América do Sul.

Na visão de Antonio Carrere, vice-presidente de vendas e marketing da John Deere para a América Latina, o mercado tende a avançar até 5% frente ao ano passado. As taxas de juros, entretanto, continuam sendo um fator de impacto importante para o setor, exigindo atenção constante do produtor, avalia Carrere.

O desafio será acelerar soluções voltadas à realidade do produtor brasileiro”

— A. Carrere

Produtores têm buscado opções de financiamento em condições mais atrativas, a exemplo dos consórcios, ou mesmo recorrendo a compras à vista, como tem ocorrido nos segmentos de frutas e cana-de-açúcar, segundo Junqueira. Sócio de mercados de capitais do BMA Advogados, Felipe Prado identifica a busca dos produtores de opções no mercado de capitais por meio de fundos estruturados voltados para o agronegócio, que têm crescido recentemente. O estoque de recursos estacionados em Cédulas de Produto Rural (CPR), Letras de Crédito do Agronegócio (LCA), direitos creditórios e recebíveis do setor, além do Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas do Agronegócio (Fiagro), aproximaram-se de R$ 1,27 trilhão em março deste ano, saltando 511% desde 2021.

Criada no final de 2023 para levar adiante uma modelagem inédita de compra de maquinário, a Cooperativa dos Produtores de Soja e Milho do Estado de Mato Grosso (Cooprosoja) só decidiu ir ao mercado quando atingiu uma massa crítica de mil produtores associados, relata Fernando Cadore, presidente da entidade. O salto nos custos das máquinas após a pandemia, acrescenta ele, estimulou um grupo de produtores a formatar a operação de compra de dezenas de colheitadeiras a um custo de “alguns milhões de reais”, conforme Cadore, que prefere não anunciar valores por exigências contratuais.

Esse primeiro pacote, numa combinação de recursos dos próprios produtores, financiamento do fabricante e crédito bancário, foi fechado com a New Holland em 2024 e teve a participação de quase 70 produtores de mais de 20 municípios do Mato Grosso. Os descontos variaram entre 15% e 20%. “Posso dizer que foi a maior transferência de market share de um fabricante para outro em Mato Grosso”, diz Cadore.

A próxima operação envolverá a importação de 50 a 100 unidades de escavadeiras e pás-carregadeiras da China. O presidente da Cooprosoja espera que o primeiro carregamento chegue ao Estado nos próximos 100 dias.

A indústria espera um ano normal nos setores de soja, milho, algodão, café, cana, citros e pecuária

Com 3,3 mil hectares plantados com soja e milho em três propriedades na região de Nova Canãa do Norte (MT), onde também cria 7,5 mil cabeças de gado nelore, Mário Wolf Filho investiu perto de R$ 5,26 milhões no ano passado na compra de uma colheitadeira John Deere e um descompactador, financiados pelo Sicredi. O produtor colocou parte da produção de milho, um trator usado e uma camionete na compra ainda três tratores novos, dois dos quais para uso na pecuária. “O maquinário supriu a incorporação à área de lavoura no ano passado de 700 hectares de pastagens degradadas”, acrescenta Wolf Filho.

No ano passado, retoma Carrere, a John Deere concentrou esforços em ajustes estratégicos na rede de concessionários e distribuidores para garantir um início de 2025 mais saudável. A montadora está investindo R$ 700 milhões para ampliar sua unidade em Catalão (GO) com o objetivo principal de nacionalizar a produção da tecnologia See & Spray, baseada em visão computacional, inteligência artificial e machine learning, que permite que permite identificar e aplicar herbicidas com precisão, apenas onde há necessidade do uso do defensivo, detalha o executivo.

A companhia investirá ainda R$ 230 milhões até 2026 na planta de Montenegro (RS), onde fabrica tratores, na implantação de novas linhas, em nacionalização de componentes e na expansão da armazenagem, de áreas operacionais e da infraestrutura de apoio. Inaugurado em dezembro do ano passado, num investimento de R$ 180 milhões, o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Indaiatuba (CPD-I) tornou-se o primeiro da John Deere no mundo voltado exclusivamente para a agricultura tropical, afirma Carrere. “O desafio será acelerar o desenvolvimento de soluções voltadas à realidade do produtor brasileiro, concebendo e testando pela primeira vez tecnologias localmente, considerando variáveis de solo, clima, conectividade e sistemas de produção regionais”, completa o executivo.

A AGCO, diz Junqueira, mantém inalterado o plano de investimentos no país, antecipando um cenário positivo entre 2026 e 2030, frente à expectativa de expansão da área plantada e de aumento da produtividade nas lavouras, o que demandará mais máquinas agrícolas. Em fevereiro passado, a companhia anunciou investimento de R$ 19 milhões na expansão de suas operações em Jundiaí (SP), com a instalação do Centro de Excelência de Transmissões Reman, para remanufatura de transmissões continuamente variáveis e de transmissões mecânicas, e da nova sede da AGCO Academy. A unidade terá capacidade para treinar em torno de 600 profissionais por ano, oferecendo treinamentos técnicos e comerciais, de peças e de gestão. “Teremos capacidade para treinar melhor nossa rede e também nossos clientes”, afirma Junqueira.

Fonte: Valor

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