De chinelos de dedo a FiveFingers, a moda nunca esteve tão focada em nossos pés e os números comprovam essa obsessão. No último trimestre, o Ama Slide em borracha da The Row alcançou o primeiro lugar na Lyst Index como o produto mais buscado e comprado, enquanto o Vibram FiveFingers apareceu na quinta posição no mesmo relatório. As tendências de calçados seguem cada vez mais voltadas aos pés, com um apelo do ugly fashion que já reportamos por aqui.
Esse fascínio vai muito além da estética, ele se espalha das passarelas às redes sociais e aos looks das celebridades, dominando o street style. Parte desse interesse vem do fetiche, que mistura intimidade e provocação, e mesmo sendo incomum ou inusitado funciona também como um atestado de fashionista. Com cada detalhe do pé se tornando ponto de expressão, essa febre mostra como o universo da moda continua reinventando até as partes mais inesperadas do corpo. Para descobrir mais sobre essa obsessão, continue a leitura.
Foto: Dua Lipa (Reprodução/Getty Images)
uma volta ao tempo
As meias split-toe que deram origem às tabis surgiram no Japão a partir do período Muromachi (séculos XIV–XVI), confeccionadas inicialmente em linho e couro. Com o passar do tempo e, sobretudo durante o período Edo (1603–1868), o algodão passou a ser a matéria-prima mais comum, o que ampliou o uso do calçado entre diferentes classes sociais. Já no final do século XVIII, versões bordadas e ornamentadas começaram a aparecer nos pés de cortesãs e atores kabuki, marcando o primeiro salto das tabis de peça funcional para objeto de desejo e estilo.
Enquanto isso, na Europa do século XIX, outra história curiosa chamou atenção. A condessa Virginia Oldoini, mais conhecida como Condessa de Castiglione, ficou famosa por seu interesse em registrar sua própria imagem. Conhecida como uma das mulheres mais fotografadas de sua época, ela usava os retratos não apenas para exibir sua beleza, mas também como forma de afirmar seu status social. Com o passar dos anos e os sinais da idade, passou a desviar o foco das lentes para seus tornozelos, transformando-os em protagonistas. Um gesto que poderia parecer trivial foi interpretado como uma combinação de vaidade e resistência diante das pressões sociais pela juventude eterna, além de mostrar que até partes do corpo antes consideradas secundárias podiam carregar códigos de poder e estilo.
Décadas depois, Martin Margiela reinterpretou esse calçado tradicional japonês e levou as tabis para o universo da alta-costura. Em 1988, o estilista belga apresentou as tabi boots, botas que reproduziam a separação do dedão característica das meias split-toe. O modelo causou estranhamento à primeira vista, mas rapidamente se tornou um ícone cult e segue sendo febre entre as fashionistas.
por que os pés fascinam a moda?
Os pés são uma extensão do nosso corpo e, consequentemente, do nosso estilo. A moda flerta com eles há muito tempo e parte desse fascínio tem explicação neurológica, já que no cérebro as áreas que processam as sensações dos pés e dos órgãos genitais ficam muito próximas. Essa ligação cria uma atração sutil, muitas vezes percebida de forma inconsciente, que a moda aproveita para explorar novas possibilidades criativas. Cada detalhe do pé, dos dedos ao tornozelo, do arco às articulações, se transforma em ponto de expressão. Recortes estratégicos, transparências e formatos inusitados criam silhuetas quase que inesgotáveis.
Além do apelo estético, os pés carregam um significado simbólico. Escolher uma tabi da Margiela, um flip-flop da The Row ou um tênis split-toe funciona como um código entre fashionistas, sinalizando conhecimento de tendências e conexão com este universo.
Foto: @sofiamcoelho (Reprodução/Instagram)
Na era digital, esse fascínio se intensifica ainda mais. Redes sociais e sites especializados transformam o pé em destaque de posts virais e discussões de estilo, consolidando seu lugar como espaço de experimentação e criatividade. Ao mesmo tempo, o mercado acompanha essa demanda com calçados ousados, pedicures de luxo, joias e acessórios dedicados, reforçando a expressão pessoal e abrindo novas oportunidades no mundo da moda.
Foto: Tabi Boots (Reprodução/Getty Images)
marcas que ditam a obsessão pelos pés
Quando falamos sobre marcas que ditam a obsessão pelos pés, é inevitável não começar pela Maison Margiela, que mantém o recorte split-toe em diversos modelos ao longo dos anos — das icônicas botas do final dos anos 1980 às sapatilhas, scarpins, loafers, sandálias e tênis. Além disso, colaborações como o Puma x MM6 Tabi Speedcat (2021) resgatam esse corte em um sneaker esportivo, enquanto o Nike Rift (1996) permanece referência histórica entre os tênis com divisão entre o dedão e os demais dedos.
Foto: Caterina Mongillo (Reprodução/Metagirl)
Em 2005, a Vibram lançou o FiveFingers, resultado da parceria com o designer Robert Fliri para reproduzir a sensação de andar descalço com a proteção de um calçado técnico. Cada dedo ganhou seu próprio compartimento, permitindo maior mobilidade e distribuição natural do peso. Originalmente projetado para corredores, o modelo logo conquistou o street style e, no segundo trimestre de 2025, foi destaque na Lyst Index como o quinto produto mais buscado e comprado na plataforma.
Foto: Schiaparelli (Reprodução/Divulgação)
Schiaparelli, conhecida por peças que parecem verdadeiras obras de arte e inspiradas no surrealismo de Salvador Dalí, trouxe o pé como elemento escultórico a partir da coleção Outono/Inverno 2013 sob a direção de Guillaume Henry, com releituras em 2016 e entre 2019 e 2022. Ao longo desses anos, a marca criou saltos com unhas douradas, slingbacks com pedicure metálica e sapatos-escultura que imitavam dedos.
Foto: Rick Owens (Reprodução/Divulgação)
Curiosamente, o estilista Rick Owens, conhecido por sua assinatura excêntrica, deu um passo inédito em 2021 ao criar uma conta no OnlyFans dedicada exclusivamente a divulgar pack do pézinho com suas próprias criações. Ao monetizar esse detalhe tipicamente secundário, ele transformou o pé em elemento central de sua estratégia de branding, reforçando ainda mais sua identidade provocadora e ousada.
No ano passado, a colaboração entre a Adidas e a marca sueca Avavav apresentou o “Superfinger Superstar”, que reinterpreta o clássico Superstar da Adidas, com garras independentes para cada dedo do pé. O modelo roubou todos os holofotes durante o desfile de Primavera/Verão 2025 da Avavav na Milan Fashion Week.
Foto: @monikh (Reprodução/Instagram)
Para fechar, o mais recente lançamento da The Row, marca das gêmeas Olsen e conhecida pelo Quiet Luxury, transformou o chinelo de dedo em borracha em um verdadeiro fenômeno fashion e também controverso. O “Dune Classic Sandal in Rubber”, apresentado na coleção Spring/Summer 2025, rapidamente se tornou item de desejo absoluto, chegando à primeira posição no último relatório da Lyst Index entre os produtos mais buscados e comprados na plataforma.
Essa obsessão pelos pés não se limita apenas a criações de alta-costura ou ao sucesso no street style. Mesmo itens do dia a dia, como as icônicas Havaianas, carregam esse fascínio, transformando um simples chinelo em símbolo de conforto, estilo e identidade cultural. Do detalhe escultórico de Schiaparelli ao casualismo das Havaianas, os pés continuam sendo uma das maiores apostas da moda. Não é à toa que não faltam acessórios para eles, como anéis, tornozeleiras e diferentes tipos de estilos de pedicure, tornando essa região ainda mais interessante e carregada de informação de estilo. O fetiche que envolve os pés reforça seu poder de despertar atenção, desejo e curiosidade, tanto no universo fashion quanto na cultura popular.
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Fonte: Steal the Look
