Entenda como Trump pode quebrar regra de tratado que ele mesmo ajudou a criar | Mundo

A imposição de tarifas de 25% para produtos do Canadá e México, que agora está pausada, fez com que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, entrasse em uma zona de contradição. Tecnicamente, o líder americano ficou perto de quebrar uma regra de um tratado que ele mesmo forçou a criação durante o seu primeiro mandato, o USMCA, sigla em inglês para o tratado EUA-México-Canadá.

O “tarifaço” viola os artigos 2.15 e 2.16 do capítulo 2, que trata do princípio de Tratamento Nacional e do acesso ao mercado de bens. Em resumo, O USMCA estabelece que nenhuma das partes pode aplicar taxas ou impostos sobre exportações para outra parte, a menos que essas mesmas cobranças também sejam aplicadas ao mercado interno. Além disso, todas as taxas relacionadas à importação ou exportação devem refletir apenas o custo dos serviços prestados, sem servir como proteção indireta a produtos domésticos ou como tributação fiscal.

“O tarifaço, do ponto de vista do acordo, é ilegal. Ele viola um tratado que define uma zona de preferência tarifária, os termos que foram negociados, de que os três países teriam preferência do ponto de vista tarifário. O acordo existe para se ter previsibilidade”, explica Marcela Franzoni, professora de Relações Internacionais do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo e do IBMEC-SP.

Para a professora, a possibilidade de um rompimento do acordo é remota, tanto pelo grau elevado de interdependência que os três membros atingiram: “O ambiente de negócios está muito integrado, tanto pelo acordo como pela questão da fronteira”.

O USMCA foi celebrado por Trump durante o seu primeiro mandato. A razão para isso se deu por que, na visão dele, o Nafta representava um prejuízo aos interesses dos EUA, prejudicando os trabalhadores americanos ao privá-los de emprego, sendo considerado uma “catástrofe” para o país.

Uma das normas estabelecidas pelo novo tratado diz respeito justamente aos termos trabalhistas, especificamente ao trabalhador do setor automobilístico: foi determinado um piso de US$ 16 por hora para a mão de obra de pelo menos 40% das empresas desse ramo.

Em termos gerais, a professora considera o USMCA um avanço em relação ao Nafta, por ampliar a regulação sobre mais áreas antes pouco ou não abarcadas, como comércio digital por exemplo, e fomentar a interdependência entre os três países, especialmente do ponto de vista comercial, que é o grande foco do acordo:

“O Nafta e o USMCA são historicamente um acordo de livre comércio, não almejando ser uma organização internacional, como é o caso da União Europeia (UE). A maior prova disso é que os três nunca negociaram um acordo que regula o fluxo de pessoas”

Assinado em 2018 e iniciado de forma oficial em julho de 2020, o USMCA substituiu o Nafta como o acordo de livre comércio vigente entre as três nações da América do Norte desde 1994.

O USMCA delibera, por exemplo, sobre:

  • Transferência de dados digitais entre as três partes do acordo;
  • Acesso a dados abertos dos governos;
  • Colaboração entre os países em questões de segurança cibernética
  • Garantia de proteção ao consumidor.

Por ter sido negociado antes da popularização da internet, o Nafta não abrangia esses tópicos.

No setor agrícola e alimentício, o tratado abriu caminho para o aumento das importações de ovos, laticínios e carne de aves dos Estados Unidos pelo Canadá, enquanto os EUA passaram a importar com mais facilidade produtos canadenses como amendoim e seus derivados, açúcar e algodão. Esses itens enfrentavam restrições sob o antigo Nafta. A limitação às importações de laticínios americanos pelo Canadá, por exemplo, foi um ponto central nas negociações do novo acordo.

O tratado de 2020 definiu novos parâmetros de leis trabalhistas a serem seguidos pelos três países membros, como a erradicação do trabalho infantil e do trabalho análogo à escravidão, condições dignas de trabalho e liberdade sindical e negociação coletiva. Especificamente em relação ao México, ficou acordado que o país deveria realizar uma reforma trabalhista.

Fonte: Valor

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