O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou na última quarta-feira (2) “tarifas recíprocas” a 185 países sobre produtos importados aos americanos, data chamada por Trump de “Dia da Libertação”.
Aplicada ao Brasil e a outros países que exportam aos Estados Unidos, a alíquota mínima de importação de 10% estava em vigor desde sábado (5), mas foi interrompidas por 90 dias, segundo informou Trump hoje.
A exceção é a China, cuja tarifa foi aumentada para 125%, e outros países que eventualmente tenham retaliado os Estados Unidos.
Tarifas são encargos financeiros cobrados sobre produtos importados quando cruzam a fronteira de um país, segundo informaram especialistas consultados pelo Valor. Elas funcionam como se fossem um “imposto” sobre o comércio internacional e podem ser calculadas como um percentual do valor do produto (caso das novas alíquotas anunciadas por Donald Trump), preço fixo por unidade ou combinação de ambas.
“Quando um país impõe tarifas, ele aumenta o custo dos produtos importados, potencialmente favorecendo produtores domésticos que não enfrentam essa taxação adicional”, explica Claudio Felisoni, professor de economia da Universidade de São Paulo (USP).
Os custos das tarifas de importação, no entanto, são pagos pelos importadores, que geralmente repassam esse valor adicional aos consumidores por meio de preços mais altos.
O que é o tarifaço de Trump?
Tarifaço de Trump é o nome como ficou conhecido popularmente no Brasil as “tarifas recíprocas” apresentadas pelo presidente dos EUA.
Na visão do presidente americano, as chamadas “tarifas recíprocas” se justificam pelo déficit comercial. Ele argumenta que os Estados Unidos enfrentam relações comerciais desequilibradas, em que os parceiros impõem tarifas mais altas sobre produtos americanos do que os EUA aplicam aos deles.
A medida tem caráter protecionista, uma política econômica que visa proteger indústrias domésticas da concorrência estrangeira por meio de impostos, cotas, subsídios e regulamentações.
O protecionismo costuma ser uma política aplicada em indústrias nascentes, que precisam ser reforçadas, diferente do caso da economia americana.
Entre as consequências do protecionismo, Felisoni pontua a redução da competitividade global, menor eficiência econômica, diminuição da inovação e do crescimento econômico mundial.
O tarifaço, na visão do economista Roberto Troster, também não é uma solução eficaz para déficits estruturais, como tem sido defendido por Trump.
“Tarifas já foram tentadas na década de 1930 e só pioraram a situação. Quando um país impõe uma taxa, outros reagem e colocam mais. É um custo a mais para os dois lados, em um jogo que todos perdem”, analisa Troster.
Consequências do tarifaço de Trump
Se o tarifaço voltar a ser aplicado por Trump após os 90 dias de pausa, é provável que o primeiro impacto na economia global ocorra nas bolsas de valores, com uma reavaliação no preço das ações negociadas — nesta quarta-feira, com a notícia da pausa nas tarifas recíprocas, os índices mais importantes de Wall Street tiveram uma alta expressiva.
Além da reação imediata do mercado financeiro, economistas apontam para a elevação das expectativas de inflação nos EUA, já que pode haver o repasse das tarifas aos consumidores americanos.
Na sexta-feira(4), Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed), o Banco Central americano, apontou que, “embora a incerteza continue elevada, agora está ficando claro que os aumentos de tarifas serão significativamente maiores do que o esperado”.
Segundo Bruno Imaizumi, economista da consultoria LCA, é provável que haja, ainda, uma redução de exportações americanas, prejudicando empresas que dependem de mercados externos. Entre as possíveis exportações impactadas, de acordo com Felisoni, estão os produtos agrícolas (soja, milho e carne), aeronaves, equipamentos industriais, produtos farmacêuticos e semicondutores.
“O que o governo Trump está fazendo agora resultará em algo parecido com o que o Reino Unido fez ao sair da União Europeia no médio prazo. Ele está se distanciando de um mundo mais conectado, onde as cadeias de suprimentos são mais complexas e interligadas”, analisa Imaizumi.
Na visão de Felisoni, da USP, é possível que aconteça uma reestruturação nas cadeias de suprimentos globais e aumento de preços recorrentes, além de um possível desenvolvimento de blocos comerciais regionais e de novos acordos bilaterais.
Consequências para o Brasil
Caso Trump retome o tarifaço após os 90 dias de suspensão, apesar de a tarifa imposta ao Brasil ser menor que a da China, os produtos brasileiros devem ficar mais caros ao chegarem aos Estados Unidos.
De acordo com Troster, esse movimento pode levar a um excesso de ofertas no mercado nacional e, por isso, alguns bens podem, inclusive, ter uma redução no preço. Ele cita como exemplo o aço, cuja tarifa de 25% imposta por Trump foi reduzida para 10% nesta quarta-feira durante 90 dias.
No entanto, pela alíquota menor, o Brasil pode também obter uma vantagem competitiva em relação aos outros países e aumentar suas exportações aos EUA.
Já que serão taxados em 125% por um dos seus principais exportadores, os produtos chineses, por sua vez, podem concorrer com novas indústrias, inclusive a brasileira, levando, segundo Troster, também a uma pressão deflacionária nos preços dos bens americanos e chineses.
“No final, pode ser que o Brasil não seja tão afetado, mas tudo isso vai depender do quanto o resto do mundo vai reagir também”, conclui Troster.
Fonte: Valor