Quem é a única mulher intérprete puxando samba no Carnaval? Conheça Grazzi Brasil

Nascida no bairro do Rio Pequeno, em São Paulo, ela cresceu em uma comunidade e descobriu cedo sua paixão pela música. “Desde criança, eu sabia que queria ser cantora”, conta. Influenciada pela sua mãe, que ouvia Jorge Ben e Tim Maia o tempo todo, Grazzi, aos 13 anos, integrou sua primeira banda, a Black Zuca. “Aos 14 anos, descobri que o pai da minha mãe tocava e cantava. Só soube disso porque havia uma foto antiga dele segurando um violão, que na época era uma pintura. Nunca conheci meu avô, mas sempre senti que a música estava no meu sangue. Tenho um irmão muito talentoso, que desenha e canta bem, mas a cara de pau da família sempre fui eu”, brinca. Aos 22 ela entrou para o samba.

Apesar das dificuldades, Grazzi nunca desistiu. Aos 15 anos, engravidou e se tornou mãe aos 16, conciliando a maternidade com sua busca por um espaço na música. “Muitas pessoas diziam que eu não ia conseguir, mas, mesmo sem apoio, fui persistente. Quando você tem um sonho e acredita nele, é difícil pensar em outra coisa”, relembra. Seu talento a levou a se tornar a primeira mulher a assumir o microfone da Vai-Vai, tradicional escola de samba de São Paulo, em 2018.

Seu primeiro samba defendido foi o de 2015 do Vai-Vai, em homenagem a Elis Regina, e a vitória abriu novas portas. Nos anos seguintes, Grazzi defendeu outros sambas em disputas, sempre com destaque e sucesso. “O Carnaval mudou a minha vida, mas nada veio fácil porque sou mulher em um meio predominantemente masculino. Eu achava as músicas muito rápidas e nunca imaginei que cantaria samba. Minha mãe e minha família sempre torceram para a Vai-Vai, mas eu nunca fui de frequentar a quadra. Só que, ironicamente, a primeira escola de samba onde cantei foi justamente a Vai-Vai”, afirma.

Já em 2017, Grazzi viveu um momento de virada em sua trajetória. Umbandista, ela recebeu uma mensagem que a incentivou a seguir firme em sua jornada musical. No mesmo ano, o grupo com quem costumava cantar decidiu não ter mais mulheres do palco. Sem espaço ali, encontrou outra equipe e seguiu em frente. Paralelamente, fez um teste para um musical sobre Cartola e passou, marcando sua estreia nos palcos teatrais.

A escolha desse samba para o Carnaval de 2018, que homenageava Mãe Menininha do Gantois, foi inesquecível. O grupo ao qual Grazzi pertencia não era oficial da escola. Mesmo assim, a força da interpretação e a aceitação popular fizeram com que a música caísse no gosto do público. “Foi uma loucura, o samba caiu na boca do povo e me levou para a ala musical da escola. Fico arrepiada até hoje“, diz.

Em 2018, ela se tornou a primeira mulher a puxar o samba na avenida pela Vai-Vai, enfrentando muito preconceito. O sucesso em São Paulo chamou a atenção do Carnaval carioca, e Grazzi recebeu um convite para cantar na Paraíso do Tuiuti, onde ajudou a escola a conquistar o vice-campeonato. Em seguida, passou pela São Clemente e pela Estrela do Terceiro Milênio, escola onde segue como única mulher à frente de um microfone no Grupo Especial.

Mesmo com os desafios, ela se orgulha de abrir caminho para outras mulheres. “Depois de Eliana de Lima e Dona Bernadete, foram 15 anos sem ver uma mulher intérprete em São Paulo. Então, espero abrir portas. Vejo mais mulheres gravando e formando corais, e se eu pude contribuir de alguma forma, fico feliz. No meu caso, tive a sorte de encontrar pessoas corajosas que me deram espaço, e trabalhei muito para mostrar tudo o que posso entregar”. Ainda assim, destaca que há poucas mulheres ocupando o posto de intérprete principal. “Para nós, sempre é 10 vezes mais difícil provar nosso valor. É uma luta diária e constante, mas tenho muito orgulho da minha trajetória”, reflete.

Atualmente, Grazzi se divide entre os palcos e o Carnaval, esse ano também se apresentou no musical sobre Martinho da Vila, no Rio de Janeiro. Agora, Grazzi divide o microfone com Darlan Alves na Estrela do Terceiro Milênio, que tem como samba-enredo o tema “Muito além do Arco-Íris — Tire o Preconceito do caminho que nós vamos passar com o Amor“.

Com nove anos de Carnaval e prestes a encarar mais um desfile, ela segue firme em sua trajetória. “Sempre fico com frio na barriga, mas tento dar o meu melhor. Estou ao lado do Darlan Alves, que já tem 20 anos de Carnaval, e sigo aprendendo com ele e com o carinho dessa comunidade. Será um Carnaval maravilhoso! O enredo traz um tema que nunca foi abordado dessa forma. Contamos histórias com respeito e cuidado, e isso é o meu jeito de protesto. Representar essas histórias é uma grande responsabilidade. Se um dia eu falhar, ao menos terei tentado de todas as formas fazer certo, porque cantar é o grande amor da minha vida“, finaliza.

Fonte: Glamour

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